Odisseia do Escritor
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 Será que eles vão rir? Por Wilson Júnior

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willjuh




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MensagemAssunto: Será que eles vão rir? Por Wilson Júnior   Será que eles vão rir?  Por Wilson Júnior Icon_minitimeQui Jan 08, 2015 8:06 pm

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willjuh




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MensagemAssunto: Re: Será que eles vão rir? Por Wilson Júnior   Será que eles vão rir?  Por Wilson Júnior Icon_minitimeQui Jan 08, 2015 8:50 pm

Será que eles vão rir?

- Por que eles não riem mais? - questionou ele para si com tristeza enquanto vestia sua roupa colorida. - O que aconteceu? - pensava amargo enquanto tirava o estojo de maquiagem da mochila puída.

O camarim era mal iluminado, apenas uma luz amarela localizada no topo do grande espelho manchado quebrava a penumbra, fornecendo luz apenas para que o sujeito não se arrumasse na escuridão completa. - Pelo menos a escuridão esconde a imundice que toma conta desse lugar. - pensava ele olhando em volta e sentindo o ambiente opressor agravar sua tristeza.

Ele começou a maquiagem, primeiro a pasta branca, ao redor dos olhos, nas sobrancelhas e bochechas, um pouco de pó para secar a pasta, depois o blush azul nas bochechas, o batom roxo destacando a imensa boca de palhaço. Por fim fez a gota azul debaixo do olho esquerdo, era uma maquiagem de palhaço triste, refletindo aquilo que ia em seu coração.

- É por isso! - exclamou com uma pontada de felicidade encarando o rosto estranho no espelho. - É essa estúpida maquiagem triste, como posso levar felicidade vestindo uma máscara de tristeza? - constatou ele satisfeito.

Com o espírito reanimado pegou o pano sujo e embebeu em removedor esfregando a pele do rosto com força para retirar a expressão negativa pintada nela. Esfregou com força e vontade como se quisesse limpar a tristeza do espírito com o remover de maquiagem. A pele ardia mas estava limpa e ele poderia começar de novo.

Novamente iniciou o processo, primeiro a pasta, depois o pó. Mas dessa vez o blush era rosa, dando automaticamente um ar de jovialidade e ânimo na máscara nova, pegou o baton vermelho para dar o toque final e especial, pintou a boca e fez uma pequena bola no nariz.

Ele se olhou no espelho por alguns segundos, testou um grande sorriso, mas seu rosto se deformou em uma máscara de tristeza novamente.

Lembrou-se das risadas da noite anterior e pensou que eles riam sim, mas não das coisas divertidas que fazia, riam por que o achavam patético, todos acham palhaços patéticos hoje em dia. Eles riam de mim e não comigo. Eles zombam de mim e do que represento.

- Malditos comediantes de stand-up! - disse o palhaço em voz alta, lembrando-se das entrevistas, “é um tipo diferente de humor”, “é um humor de cara limpa” diziam eles de maneira presunçosa, como se eles tivessem inventado o “fazer rir”. Eles apenas humilham os outros, o palhaço zomba de si mesmo, traz o humor das coisas simples e inocentes e não ofendendo outras pessoas, pensava ele sentindo a raiva crescer dentro de si. Foram eles que ensinaram esse escárnio ao público.

Ele se encarou mais uma vez, observando o rosto alegre no espelho, testou novamente um sorriso e se assustou profundamente com o que viu. O rosto de um psicopata estava ali, distorcido pela maquiagem, mas pode ver seus olhos assassinos e sua boca vermelha com dentes pontiagudos. No susto pegou o pano com removedor e esfregou com violência no rosto. Sentiu a pele arder dos solavancos, mas só parou quando a máscara tinha desaparecido por completo.

- Maldito John Wayne Gacy e maldito Stephen King! - gritou ele para o espelho irritado e a luz tremeluziu. - Psicopata maldito que desvirtuou a pureza de uma figura infantil, e o autor oportunista que fez sua história ganhar proporções mundiais. Aqueles puros de verdade para rir de nosso humor, já crescem com um pavor psicótico em decorrência da terrível imagem que a mídia carniceira construiu de nós. - palestrou em sua mente cheia de ódio.

Ele não podia desistir, pode ter sido o tom errado de vermelho na boca e no nariz. Queria usar o vermelho, pois é a cor da paixão que ele tinha pelo trabalho e pelas crianças. Ao pensar nas crianças uma gota de suor desceu gelada pelas suas costas e ele sentiu um frio na espinha. Balançado a cabeça agressivamente de um lado para outro ele afastou os pensamentos.

Precisava voltar ao trabalho, era algo na maquiagem pensou novamente com uma sensação de déjà vu. E mais uma vez ele voltou ao processo, tirou o grande estojo de dentro da bolsa, olhou para ele orgulhoso, cheio de cores contendo infinitas possibilidades. Primeiro a pasta, depois o pó, por fim as cores, depois ódio, medo e removedor.

Ele perdeu a noção do tempo, das repetições. A pele do rosto já esfolada e irritada misturando pequenas manchas de sangue aos resíduos de maquiagem no pano sujo, mas a obsessão turvava a percepção de dor. Criava diferentes pinturas, mas elas não o satisfaziam, eram tristes demais, ou loucas, dementes, agressivas. Ele tentou outras cores, combinações que no fim eram arrancadas com violência.

- É o vermelho! Preciso acertar o tom do vermelho. - sua obsessão cíclica voltando novamente para o ponto de partida.

E no vermelho ele foi, testou todos os tons, combinou com outras cores, e a sucessão de erros o irritava cada vez mais, a roupa colorida já estava em pedaços no chão, em decorrência de um ataque de fúria, seu corpo magro e marcado agora tremia no frio do ambiente mal climatizado. As mãos sujas tremiam enquanto ele tentava ajustar a última combinação em vermelho no seu rosto, no momento final o solavanco de frio fez com que um risco borrasse tudo. Furioso mirou o espelho manchado, olhando a máscara aplicada sobre a face irritada, tentou forçar um sorriso, mas o risco borrado o deformava, a fúria em seus olhos não deixava passar felicidade, aquele vermelho era fajuto, não representava sua paixão. Num átimo de fúria sua mão direita espalmada foi de encontro ao espelho manchado.

- Maldito espelho! - gritou em desespero e amargura sentindo o vidro lacerar a palma de sua mão. - Você mente, o rosto está perfeito! - gritava ele no ímpeto da loucura.

Ele olhou para da mão de onde o filete de sangue escorria, depois para o espelho que agora refletia pequenos fragmentos da sua imagem invés da única grande. O sangue escorria em seu tom vivo e escarlate. Aquele era o vermelho que ele queria, pegando uma paleta ele pressionou o corte para que o líquido fluísse com mais força. Depois que a paleta estava cheia, enrolou um pano na mão ferida para estancar o sangramento.

E mais uma vez o pano sujo raspou a pele cansada para que o processo fosse reiniciado, não havia mais removedor, então ele tinha que usar água e mais força. A violência era tamanha que a pele já começava a se deformar, mas ele não se importava, pois a pele sem maquiagem era a verdadeira máscara, na verdade ele era o palhaço e o resto era a ilusão. O importante era a risada.

A pasta, o pó, o blush e o sangue. Como era lindo! Ele passava o pincel ao redor da boca, marcando-a com o líquido viscoso, revelando suas tonalidades na aplicação. Ao fim ele estava feliz. Era o vermelho. Ele olhava suas pequenas cópias com satisfação. Ele com certeza vão rir.

Realizado, ele buscou a veste rasgada ao chão e iniciou o concerto. Não foi difícil por ela já ser uma colcha de retalhos. Quando ficou pronta ele voltou-se novamente para o espelho apenas para o terror tomar conta de tudo.

O lindo vermelho estava arruinado, tinha virado um marrom, seco e sem vida. Ele buscou a paleta e ela estava igual.

- Não, não, não! - chorava e as lágrimas que escorriam terminavam a ruína da maquiagem. Desabando no chão e convulsionando em soluços. O choro era misto de frustração, tristeza, ódio.

- Calma, eu só preciso de mais! - pensou entre soluços, na mesma velocidade o que o choro veio ele virou uma grande gargalhada. Eles vão rir!

Ele se levantou foi até o espelho e pegou um grande caco do vidro quebrado com a mão esquerda, e fez um corte profundo no pulso direito fazendo com o vermelho corresse farto. Colheu em um pote depois enrolou um pano no pulso para estancar o sangramento.

E o processo foi reiniciado, mais pasta, mais pó, mais blush e mais sangue. E para seu desespero não conseguia segurar o pincel com sua mão direita, o corte foi muito fundo e danificou os tendões, havia perdido o controle dos dedos, mas não se abateu e iniciou o procedimento com a mão esquerda, seria mais lento, mas ele conseguiria.

O vermelho era lentamente espalhado em uma metade da boca e depois na outra de maneira lenta e falhada. Quando ele finalmente terminou e foi conferir o reflexo fragmentado, um choque percorreu seu corpo. A primeira metade já estava corrompida, no tom escuro e sem vida.

- Será que eles vão rir? - pensou com amargura.

Mais pasta, mais pó, mais blush e mais sangue.
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zizgz




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MensagemAssunto: Re: Será que eles vão rir? Por Wilson Júnior   Será que eles vão rir?  Por Wilson Júnior Icon_minitimeSáb Jan 10, 2015 6:26 am

Triste, impressiona, e bem narrado! Gostei.
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Caio Biolcatti
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MensagemAssunto: Re: Será que eles vão rir? Por Wilson Júnior   Será que eles vão rir?  Por Wilson Júnior Icon_minitimeSáb Jan 10, 2015 2:51 pm

Isso foi... diferente. UAU! No começo eu podia jurar que você ia fugir ao tema, mas conforme foi passando, eu pude imaginar um filme na minha cabeça, com uma trilha sonora excruciante e a sucessão rápida das cenas - um verdadeiro suspense. Gostei muito da maneira solitária do seu conto, a complexidade do personagem, como você retrata "a mente como inimiga de si mesma". Bem escrito, bem formatado, com um toque poético. No geral, eu curti demais! Parabéns!
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willjuh




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MensagemAssunto: Re: Será que eles vão rir? Por Wilson Júnior   Será que eles vão rir?  Por Wilson Júnior Icon_minitimeSeg Jan 12, 2015 12:07 am

Nossa valeu!
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Ana Beatriz Firmino

Ana Beatriz Firmino


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MensagemAssunto: Re: Será que eles vão rir? Por Wilson Júnior   Será que eles vão rir?  Por Wilson Júnior Icon_minitimeSeg Jan 12, 2015 5:33 pm

Oi Wilson!
Considere que esse é o primeiro comentário que faço no fórum, tá? Um pouco de insegurança, mas vamos às minhas impressões:

Então, eu fiquei com um pouco de dúvidas quanto ao subgênero no seu texto. Bom, eu sinto uma grande carga de tensão na história. Aliás, gosto disso. Gosto quando tenho sensações enquanto leio e eu me senti tensa com a personagem. Foi uma ótima construção.
Mas, por outro lado, eu tenho que dizer que realmente tive que pesquisar para entender o que é o suspense. Segundo minhas pesquisas deveria produzir um efeito de ansiedade pelas consequências, que seria causada pela incerteza ou desconhecimento... Técnico né?
Enfim, eu não senti isso. Embora tenha ficado envolvida e entretida com a leitura.
Isso é só uma impressão... Pode ser um problema comigo. hahaha

Entretenimento garantido! Você está de parabéns.
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Tammy Marinho

Tammy Marinho


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MensagemAssunto: Re: Será que eles vão rir? Por Wilson Júnior   Será que eles vão rir?  Por Wilson Júnior Icon_minitimeDom Jan 25, 2015 9:54 am

Primeiramente seja muito bem vindo...

Eu adorei a maestria com a qual você abordou a obsessão do palhaço.
Esse comportamento destrutivo.
Isso sem em nenhum momento abandonar a poética da narrativa.

Mas assim como a colega Ana Beatriz eu não captei exatamente o suspense no conto - mas não posso julgar, porque não obtive grande sucesso em reproduzi-lo.

De toda maneira excelente conto.

E até breve.
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MensagemAssunto: Re: Será que eles vão rir? Por Wilson Júnior   Será que eles vão rir?  Por Wilson Júnior Icon_minitime

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